Mino Carta, no XVII CONFUP: “a mídia contribui de forma decisiva para a afirmação da Casa Grande”

 

O jornalista, escritor e pintor ítalo-brasileiro Mino Carta, editor da revista Carta Capital, participou na tarde desta sexta-feira (04) do painel “Os Pilares do Golpe Jurídico, Parlamentar e Midiático no Brasil”, parte da programação do XVII Congresso da Federação Única dos Petroleiros (FUP).

 

Diante de um público de aproximadamente 400 delegados e delegadas vindo de todo país, Mino provocou a reflexão sobre as relações de poder no Brasil. “De uns tempos para cá, Lula começou a falar muito em Casa Grande. Isso, confesso, me agrada muito, pois ele deve saber que com a Casa Grande não há acordo possível. Só pode haver briga, até as últimas consequências. Nós temos de pensar que se a Casa Grande é inevitavelmente responsável pelo atraso no Brasil e se manifesta de mil formas, temos que reconhecer que este é o momento de repensar em muitas coisas e fazer um profundo exame de consciência. Até que ponto a dita esquerda brasileira funcionou a contento? Eu acho que não funcionou, porque só um grande partido de esquerda e sindicatos aguerridos, prontos para a luta, podem levar o povo à consciência de cidadania”.

 

Para Mino, os movimentos sociais atuam com firmeza, mas não têm a mesma percepção dos partidos de esquerda. “Entender qual é o verdadeiro papel da esquerda é fundamental. O MST e o MTST são movimentos muito firmes, que desenvolvem uma atividade relevante há muito tempo, mas eu tenho dúvida sobre o desempenho do PT. Vagner Freitas (presidente da CUT) disse, ‘mas o PT esteve no poder por 13 anos e alguns meses e não conseguiu conter a imprensa e a mídia em geral. Por que se deu isso?’ Porque se fazem concessões exageradas a quem não as merece. Essa para mim é a essência do problema”.

 

O jornalista tratou as elites brasileiras como organizações criminosas. “São pavorosas máfias hoje no poder graças a um golpe que juntou os três poderes da república, naturalmente amparados pela mídia, porque a mídia é a porta-voz da Casa Grande. Porque os barões da mídia são os moradores cativos da Casa Grande”.

 

Golpe e resignação

Ao abordar a sessão da Câmara dos Deputados que barrou a investigação do presidente ilegítimo Michel Temer por crimes de corrupção, Mino lamentou a passividade do povo brasileiro. “O trágico e ridículo episódio da votação da Câmara da noite do último dia 02 de agosto foi uma demonstração clara de que o país está à mercê de verdadeiras máfias. Assistimos aquilo com o alinhamento habitual do povo brasileiro, como sempre conformado, certamente um dos povos mais desiguais. Somos um dos mais humilhados, ofendidos, mas ao mesmo tempo, embora isso tudo aconteça claramente, eu afirmo categoricamente que não existe um povo igual em termos de resignação mundo afora. Em um país cada vez mais insignificante e tragicamente ridículo, a sessão da Câmara teve um toque de tragicômico. Uma opera-bufa que espanta”.

 

Mino disse que aquele “espetáculo da Câmara dos Deputados” foi a prova da incompetência da Casa e da hipocrisia de tantos parlamentares. “A velhacaria é estampada no rosto deles. É a clara demonstração de que não têm o menor interesse com o país e por quem os elegeu. Essa situação do Brasil não me surpreende. A mídia contribui de forma decisiva para a afirmação da Casa Grande por todos os caminhos possíveis”. 

 

O jornalista ainda ridicularizou a conjuntura das relações de poder no país. “Nós temos o Supremo Tribunal para causar vergonha, um congresso que é o que é e um Executivo nas mãos de Temer. Temos ali um bando da máfia calabresa, mas tenho a sensação de que a máfia calabresa funcionaria melhor. Eu encaro a situação desse ponto de vista. E a partir disso, acho que está na hora de fazermos um bom, profundo e sincero exame de consciência”, sugeriu.

 

 

A mídia e a decadência do Brasil

Mino foi categórico ao traçar a relação da situação política e econômica do país e a mídia. “Podemos dizer realmente que o Brasil afundou em todos os pontos de vista, isso é inegável. A própria mídia brasileira já foi melhor no sentido que de havia ali jornalistas de muita qualidade. Teve repórteres que se chamavam Rubem Braga. Editores de redação que se chamava Claudio Abramo. Hoje estamos na mão do Merval Pereira. Ele é o semeador do que? Temos naturalmente a  Miriam Leitão. Tem sugestão de outros nomes. Sim, não faltam. Está cheio. A nossa mídia é de uma desimportância, tecnicamente pobre, mal paginada, mal impressa a imprensa. A globo consegue ser um espetáculo diuturno de vulgaridade. É um horror. E disso se nutre o povo brasileiro. Tudo é feito inclusive para contribuir, do ponto de vista cultural, intelectual, educacional, que a senzala permaneça ali. Tudo. As próprias novelas contam um Brasil que não existe. Geram, inclusive, em muitos brasileiros pobres, quando não miseráveis, um sonho de alcançar as benesses burguesas. Isso é um fenômeno grave da nossa história”.

 

Ideias erradas

O jornalista encerrou sua participação no painel do XVII CONFUP com críticas às falhas da esquerda na criação da consciência do povo. “A política social de Lula gerou resultados importantes, pois tirou da miséria absoluta 40 milhões de brasileiros, mas até que ponto criou neles a consciência de cidadania. Em quantos deles criou isso? Eu não sei até que ponto o bombardeio midiático contribuiu para vender ideias erradas, mas essa gente que evoluiu não ganhou em consciência cidadã, mas passou a sonhar em ter os mesmos favores da Casa Grande. É um fenômeno clássico, assim se criam as pequenas burguesias que na hora ‘H’ votam em Bolsonaro. Isso nos faz crer que temos eu rever muita coisa e assumir a mea culpa”.

 

Mino Carta dividiu a mesa de debates com o jornalista e deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) e Pedro Serrano, pesquisador da PUC-SP.