O Benzeno Adoece e Mata Sem Limite de Tolerância

O Sindipetro Paraná e Santa Catarina, há muito tempo, mantém em sua agenda de lutas o reconhecimento dos males causado pela exposição do trabalhador ao Benzeno e melhoria dos ambientes de trabalho que possuam esse agente comprovadamente cancerígeno. A frase, “Benzeno não é flor que se cheire”, consagrada pelo nosso saudoso Jaime Ferreira, militante incansável por uma saúde pública digna para todos, segue mais viva do que nunca.

Nessa caminhada, ocorreu no dia 16 último uma ação conjunta entre a Secretaria de Saúde do Sindicato, a Fundacentro, a Comissão Estadual do Benzeno no Paraná e o Centro Estadual em Saúde do Trabalhador (CEST), o Seminário para debater questões fundamentais para os trabalhadores: como saber se estão expostos ao Benzeno? Como saber se as medidas adotadas ao longo desses últimos 20 anos foram ou ainda são eficazes? Como saber se o patrão não está manipulando o monitoramento ambiental e omitindo os riscos do ambiente laboral?

Para ajudar nesta tarefa, foi convidada a Dra. Arline, simplesmente uma sumidade no assunto, referenciada por todos que se aprofundam nestes estudos. A pesquisadora da Fundacentro iniciou os trabalhos resgatando momentos históricos da construção da legislação sobre Benzeno, onde o protagonismo das organizações dos trabalhadores foi fundamental, em reação ao drama das vítimas desse agente cancerígeno na antiga COSIPA, e que resultou em avanços normativos importantes naquele momento.

De lá para cá, foram muitos embates com o patronato, para que tais conquistas saíssem do papel e, mais, para que a legislação continuasse avançando, conforme preconiza o Acordo Nacional de Benzeno, que teve por base a busca contínua de melhorias nas condições de trabalho e diminuição do sofrimento dos trabalhadores vitimados pelos efeitos causados pela exposição ao benzeno, sobretudo para que toda e qualquer mudança tecnológica tivesse como essência a eliminação do uso do benzeno ou a redução de emissões ao meio ambiente, onde houvesse a presença desse agente químico no processo produtivo.

Neste contexto, há uma ferramenta indispensável para se avaliar os níveis de exposição dos trabalhadores, trata-se do Indicador Biológico de Exposição ao Benzeno(IBE). Existem diversos indicadores biológicos de exposição, entre eles o sangue, porem o mais usual é a avaliação de umas substâncias (metabolizadas) sintetizada pelo corpo humano a partir do agente tóxico, normalmente presente na urina. A partir de 20 de dezembro de 2001, foi adotado o ácido trans-trans-muconico (AttM-U), na urina. O IBE deve ser utilizado como ferramenta de higiene do trabalho e como instrumento auxiliar de vigilância à saúde. É uma excelente contraprova ao monitoramento ambiental.

O AttM-U indica exposição não só pelo ar, mas pela pele também, o que pode indicar práticas e hábitos inadequados no ambiente de trabalho, como também pode indicar nível de eficácia dos EPI´s. Portanto, o IBE é uma ótima ferramenta de higiene ocupacional.

Porém, alerta, o IBE só deve ser utilizado quando se têm bem definidos a metodologia e os objetivos de sua determinação e estabelecidos os critérios de interpretação dos resultados. Pode ter pouco significado a determinação do IBE em datas pré-agendadas, como nos exames periódicos, por exemplo, que podem coincidir com períodos em que o trabalhador não executou nenhuma atividade relacionada com o benzeno como folgas de turno ou administrativo.

Assim, sem querer esgotar o assunto, a Dra. Arline considerou alguns objetivos:

  • Estabelecer correlação do indicador biológico de exposição com concentrações ambientais: recomenda-se a coleta de uma amostra de urina de todos os trabalhadores escolhidos para avaliação ambiental antes do início da(as) jornada(as) de trabalho e outra no final do período de exposição, em que for feita a avaliação ambiental. Devidamente acompanhada da descrição das atividades realizadas, assim como dos produtos químicos manipulados.
    • Para verificar perfil de exposição do grupo homogêneo estudado: coletar a urina de no mínimo 20 trabalhadores ou em todo o grupo homogêneo de exposição. As amostras de urina deverão ser coletadas no início e no final da jornada de trabalho do dia em que for feita a avaliação ambiental.
    • Para verificar exposição em atividades exposição atípica, não usual: coleta de amostra de urina no início e no final da jornada do dia de trabalho.
    • Em situação de emergência: amostra de urina coletada de 4 a 8 h após o acidente ou no término da emergência. Em situações de acidentes envolvendo o agente ou mistura que o contenha, caso o trabalhador venha a apresentar alguma alteração de saúde compatível com os efeitos agudos ao benzeno, como tontura, dor de cabeça, enjoo, irritação da pele, e outros, pois este fato, por si só, já é mais do que suficiente para comprovar a exposição e deve ser anotado em seu prontuário médico todos os valores do IBE e sintomas verificados na avaliação clínica.
    • Em caso de demanda espontânea: a coleta de urina deverá ser feita após a avaliação do Serviço Especializado de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) e de acordo com os critérios descritos nos itens anteriores.
    • Para uso no exame periódico: para uma melhor interpretação dos resultados, as amostras de urina deverão ser coletadas no início da jornada no retorno da folga de pelo menos dois dias e outra no final do terceiro dia de jornada de trabalho. Devidamente acompanhada da descrição das atividades realizadas, assim como dos produtos químicos manipulados.

 

Existe valor limite para resultado do ácido trans, trans mucônico que não deverá ser ultrapassado?

O valor encontrado de ácido trans, trans mucônico acima do considerado normal para uma população não exposta ocupacionalmente significa exposição a benzeno.

Sendo que a melhor forma de evidenciar este parâmetro é a referência do próprio trabalhador, comparando seus resultados oriundos de testes antes da exposição, após a folga, assim como construindo a relação com os resultados do GHE’s.

Sempre que houver resultados positivos de ácido trans-transmucônico deve-se investigar o local de trabalho e como as tarefas são realizadas.

Durante o curso foi lembrando que o Valor de Referência Tecnológico (VRT), preconizado no Anexo 13ª da NR-15, deve ser considerado como referência para os programas de melhoria contínua das condições dos ambientes de trabalho, sendo que não exclui risco à saúde. O VRT não pode ser igualado a Valor de Tolerância, o benzeno é uma substância comprovadamente cancerígena para a qual não existe limite seguro e exposição.

Quais as características do Ácido trans, trans mucônico urinário?

Representa uma média de 1,9% do benzeno absorvido

Vantagens

  1. a facilidade e a sensibilidade analítica de sua determinação urinária
  2. boa correlação com os níveis de benzeno no ar. O AttM-U apresenta correlação com os níveis de benzeno no ar abaixo de 1,0 ppm
  3. É possível utilizar este indicador inclusive em estudos de populações não expostas ocupacionalmente ao benzeno. A maioria dos métodos de análise laboratorial possui limites de detecção apropriados para este estudo.

Desvantagens

Interferências

(1)   a co-exposição a outros produtos químicos, como, por exemplo, o tolueno que pode inibir competitivamente a biotransformação do benzeno.

(2)   (2) a dieta, uma vez que o AttM é formado na biotransformação do ácido sórbico ou sorbatos utilizados como aditivos alimentares em produtos  industrializados como bolos, geléias, chocolates, sucos, derivados de leite, etc.

(3)   o tabagismo

Existem interferências significativas quanto ao hábito de fumar, beber, alimentos industrializados, exposições simultâneas entre outros?

Apesar das discussões sobre vários tipos de interferência na avaliação do ATTM-U em trabalhadores a literatura tem inúmeros dados de estudos em populações expostas e não expostas estudos demonstram que é possível fazer avaliações e sua correlação com a exposição ocupacional ao benzeno com segurança.

A palestrante aponta que o indicador sofre influencias, porem os estudos apontam dificuldade de generalização. Os laboratórios do Brasil estão apontando o limite de detecção do método em 0,2 ppm, porem a pouco tempo atrás essa sensibilidade era muito maior. É preciso verificar a confiabilidade laboratorial, assim como exigir um método analítico que possua o mais baixo limite de detecção e maior precisão.

O que as empresas devem fazer?

As empresas devem fazer suas próprias correlações entre a concentração de benzeno no ar e a eliminação de ácido trans, trans mucônico ou de outro IBE na urina de seus funcionários.

Devem programar as coletas de amostras de urina de todo o grupo homogêneo de exposição no mesmo dia em que deve ser feita a avaliação ambiental, antes e depois da jornada de trabalho.

Interpretação dos resultados

Se o resultado não for o esperado, pode ter ocorrido:

q  A avaliação ambiental não foi apropriada;

q  O trabalhador está submetido à outra fonte de exposição;

q  Houve de mudanças qualitativas do perfil de exposição do grupo homogêneo estudado;

q  Se um ou poucos resultados forem discrepantes, podem indicar que o GHE precisa ser reformulado;

q  Pode haver outras vias de absorção do benzeno no além da via pulmonar, e pode indicar que o trabalhador esta submetido a uma situação de risco;

q  A eficácia dos dispositivos de proteção individual e/ou coletivo utilizados estão em desacordo com suas aplicações.

E o GTB?

O GTB deve orientar os trabalhadores que eventualmente estiverem expostos ao benzeno a solicitarem da empresa a análise de sua urina.

O ácido trans-transmucônico poderia ser substituído pelo Ácido Fenil-Mercapturico. Trata-se de um metabólico específico para benzeno que não sofre interferência sobre os alimentos e outros produtos consumidos. Este também possui maior precisão analítica, sendo capaz de identifica concentrações muito baixas de benzeno. A dificuldade de aplicação desta nova técnica se dá no atendimento pelo mercado, hoje no Brasil não há laboratório que atenda essa demanda. Este debate está sendo construído através da CNPBz.

De toda a exposição e esclarecimentos feitos pela Drª Arline sobre o benzeno, o que está em jogo é a saúde do trabalhador e da trabalhadora durante e após vida laboral. Porque os efeitos e consequências decorrentes da exposição mínima ao agente são silenciosas e graves, conforme opinião geral, não há limite seguro de exposição para o benzeno e os parâmetros de controle desse agente devem ser revistos para baixo. O ACNB foi um marco para estabelecer parâmetros claros como ponto de partida no manuseio do benzeno na indústria, mas estava implícito a exigência de melhoria continua na abordagem técnica, política e previdenciária.